Decantação e Desastres
2018 | Exposição em parceria com Carina Weidle e curadoria de Agnaldo Farias. Museu Oscar Niemeyer, Curitiba - PR.
Nesta exposição, a cerâmica e a porcelana são os denominadores comuns entre as artistas. O que é o mesmo que dizer que trabalham em parceria com o fogo. É a ele que submetem a argila, intensamente manipulada até atingir o que se deseja: cabeça, fruta, mão, uma vulgar caixa de fósforos, uma pequena pilha de biscoitos.
O elenco prossegue juntando coerência com surpresas. Exímias esmaltadoras, há muita cor nessas peças cujas superfícies varam do suave ao crespo, do lizo e reluzente ao relevo acidentado. Mas ao final há o fogo e nele é comum irromper o acaso – uma rachadura quase invisível, uma variação drástica de cor, entre outros -, que é o nome que se dá ao que não se consegue controlar. Seria possível estender-se sobre esse processo fundado no tato, na doma da argila, a ansiedade e a paciência na espera do resultado do diálogo entre a matéria e o fogo em seu arco de temperaturas, mas importa sublinhar o que separa essas artistas, suas poéticas.
Algumas obras de Ligia originam-se na maceração da memória, no que chega a sua memória por decantação, como a última imagem de um filme de Kurosawa, a cena imaginada do conde Tolstoy morrendo só, numa estação. As feições de suas cabeças expressivas remetem ás das suas primas, mas, repentinamente, sem que se pudesse prever, entre elas aflora a cabeça de Marielle Franco, assassinada. E as frutas, ah, as frutas de Ligia trazem consigo a cor da noite mais profunda e misteriosa, como quando estão adormecidas nas fruteiras. (*)
Fotografias: Gilson Camargo (**)
(*) Trecho do texto de Agnaldo Farias para exposição em parceria com a artista Carina Weidle, no Museu Oscar Niemeyer, em 2018.
(**) Fotos: apenas os trabalhos da artista Lígia Borba, nomeados" Decantação".